segunda-feira, 21 de setembro de 2009

SAÚDE A CUSTOS CONTROLADOS É POSSÍVEL?

A Medicina, tal como outros sectores da actividade pública (Justiça, Ensino) tem uma relevância económica e financeira que não devemos omitir, qualquer que seja a linha de orientação política a seguir.
O problema das questões financeiras ligadas à saúde surge apenas quando elas se sobrepõem às questões técnicas e condicionam a prestação de cuidados de saúde. E este condicionamento tem vindo a acontecer, no sentido negativo, com a mudança progressiva dos regimes de financiamento e de gestão dos hospitais.
No regime dos SPA o financiamento era efectuado por dotação global e implicitamente geria-se para chegar ao fim do ano com um défice baixo (às vezes), sendo a produção menos importante quanto à quantidade, com a preocupação permanente da qualidade. Havia uma lógica de que, se querem mais actos, criem mais estruturas e contrate-se mais gente.
Com a mudança do paradigma de financiamento todos os hospitais vão a reboque do financiamento pela produção, criando uma verdadeira cultura da Medicina por números e pela quantidade dos actos: há que justificar os orçamentos e contabilizar os actos clínicos à peça. Quanto mais actos se produzirem, mais valor acrescentado para a instituição, maior o reconhecimento dos operários médicos (e outros). A falta de sistemas de regulação e de controlo da qualidade deixou este instrumento entregue nas mãos de falsos gestores. Cortou-se nos custos de modo cego e tenta aumentar-se a produção de modo cego também.
À racionalidade no controlo de custos deveria ter que se associar a racionalidade no aumento da produção, isto é aumentar a produção de actos que se traduzam de facto em melhoria de cuidados para a população.
Infelizmente não é isto que temos observado:
1 - Desqualificaram-se serviços trocando mão de obra qualificada, por mão de obra mais barata e menos qualificada;
2- Aumentou-se a produção de consultas, sem consequências concretas para a saúde das pessoas (gerando consultas desnecessárias, duplicadas ou mesmo triplicadas apenas para fazer número);
3 - Este aumento artificial do número de consultas gera uma aumento de custos de transporte (desnecessários) que se reflectem na economia individual ou mesmo no Orçamento Geral de Estado;
4 - O mesmo se pode dizer da indução do consumo de meios complementares de diagnóstico e terapêutica que agora são estimulados de modo anárquico, para aumentar artificialmente a produção.

Mas houve vantagens claras na área cirúrgica, uma vez que a existência de listas de espera revelava uma necessidade clara de cuidados na população. Falta saber como funciona a regulação, aqui mais da qualidade dos actos e das suas consequências, do que na indicação clínica. A promiscuidade entre os profissionais que colocam a indicação e que podem ser os beneficiários (financeiros) pela sua produção, coloca problemas éticos delicados a levar em consideração.
Parece então que esta lógica gestionária tem vantagem nas áreas cirúrgicas (por muito ignorante, nenhum doente se deixa operar sem esperar um resultado concreto no seu estado de saúde).

Na área do ambulatório (consulta externa, hospitais de dia, laboratórios, radiologia, fisioterapia...) o resultado é perverso uma vez que se observa a produção de um grande número de actos técnicos esvaziados de consequências práticas na saúde das populações. Se bem não faz mal também não, parece ser a lógica do sistema; uns facturam, outros têm uma sensação (errada) de estar a cuidar da saúde, outros ocupam (inutilmente) os seus dias de reforma e todos pagamos para que este sistema funcione sem benefícios reais no estado de saúde das populações (veja-se o exemplo do aumento o número de consultas no CMRRC).

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

A MONTANHA PARIU UM RATO

Finalmente, quase dois anos depois de terem iniciado funções, realizou-se uma cerimónia formal de apresentação do Desporto Adaptado no CMRRC (que já funciona também há cerca de 2 anos). No entanto há algo de estranho nesta cerimónia: no momento em que todas as formalidades são alvo de presença de entidades de tutela (campanha eleitoral assim o exige), neste caso ninguém compareceu. Da ARS não esteve ninguém (representativo da hierarquia) e o Secretário de Estado do Desporto também se escusou à última hora. Estão assim tão mal cotados pela tutela, que nem em período de campanha eleitoral conseguem ter o seu apoio directo? Já ninguém se quer associar à obra deste CA (exactamente porque ela foi escassa e trapalhona)?

Estaremos a ser injustos?
Um pequeno balanço ajudar-nos-á a responder a esta questão.

O ALERT continua não operacional e interrompido (até Janeiro?), apesar de ter sido formalmente anunciado e publicitado no Diário AS BEIRAS (e de já estar a custar uma pipa de massa dos contribuintes).

O sistema de mobilidade interna para os doentes continua a não estar ainda instalado.

Aumentaram o número de consultas externas, de modo a incrementar a facturação, triplicando o número de utentes que colocam em lista de espera para tratamento ambulatório.

Aumentaram o número de doentes hospitalizados transformando um processo de intervenção holística numa fábrica de encher chouriços. Será por isso que os doentes das seguradoras estão a recorrer aos serviços do CMR do Sul (S. Brás de Alportel)?

Alguém que tivesse de facto bom senso já teria voltado ao lugar de origem, enquanto alguém com vergonha da triste figura que está a fazer, pintaria a cara de preto.

E é assim que uma instituição fundamental para estruturar os cuidados de Reabilitação na Região Centro vê uma vez mais o seu futuro adiado (ou posto em causa).

Se este é o padrão que se prometeu, para implementar a qualidade deste Centro de modo a fazer dele uma referência europeia (???) (quiçá mundial), então há muito mais ignorantes no processo, do que alguma vez se imaginou. É o líder espiritual que está equivocado ou não estão a implementar as suas orientações? Aposto no primeiro, porque constato que alguns iluminados da MFR pensam que a qualidade resulta dos equipamentos que se compram e não da qualificação (e da qualidade) dos recursos humanos disponíveis.

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

INFORMATIZAÇÃO DO PROCESSO CLÍNICO

A informatização do processo clínico é um novo desiderato das Administrações Hospitalares. As suas vantagens teóricas são variadas que vão desde a redução do espaço de arquivo, à prevenção do erro médico, à melhor interacção entre os diferentes sectores profissionais, à melhor organização do processo na óptica da gestão logística e da facturação/administração.

Ainda no tempo do anterior CA iniciaram-se contactos com empresas fornecedoras de sistemas de informatização do processo clínico. Isto quer dizer que o processo da apreciação das alternativas estava feito e alguma apreciação dos conteúdos tinha sido começada. Este CA entrou em funções e assumiu este projecto, entregou a sua análise a um assessor da área de informática e elaborou mais uma candidatura (ou mais uma adenda a uma candidatura) que lhe permitiu comprar mais computadores (este centro deve ter mais computadores por médico que muitos hospitais centrais do país) todos financiados pelos programas comunitários (este hospital tão pequeno tem assessores e informatização que ultrapassam largamente aquilo que seria de esperar para a dimensão de produção que tem).
Eu fico espantado quando vejo um Serviço de Medicina Interna de um Hospital Central que tem 5 computadores para os médicos de um Serviço de cerca de 40 camas, quando as 40 camas do CMRRC têm em funcionamento mais do dobro dos computadores, fora os que estão inactivos por falta de utilizador).
Mais grave que isto é que os referidos computadores foram adquiridos ao abrigo do projecto de informatização do processo clínico, que continua sem funcionar quase 2 anos depois deste CA ter dado continuidade ao projecto. E o dinheiro vai saindo da conta do CMRRC e do bolso dos contribuintes. Há quem afirme que já lá vai mais de um milhão de euros!!
Haverá alguém para pôr cobro a esta rebaldaria em que ninguém é responsável por nada? A Inspecção Geral de Actividades em Saúde não tem mãos a medir e as suas investigações tardam.
Também podemos questionar porque não funciona o ALERT no CMRRC. Com consultores do calibre que nós conhecemos (os adjuntos do CMRRC são uma mais valia para qualquer um, em especial para o ALERT - presunção e água benta cada qual toma a que quer, o que é difícil é mirar-se ao espelho de manhã e não ter a resposta esperada) continuamos sem perceber onde estão os engulhos. Ou tudo não passa de uma estratégia para se continuar a pagar cada vez mais por um serviço que não existe? Será? Mais alguém factura (por baixo da mesa) com esta inércia?
Poderíamos continuar a falar do transporte interno de doentes, da falta de clarificação ao Tribunal de Contas sobre a origem do dinheiro para os cuidados continuados, mas depois faltava-nos o espaço para os comentários cada vez mais interessantes, vindos de dentro da instituição.

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